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Por Moni Abreu

Texto que recebeu o quarto lugar no II Prêmio Opinião e Notícia 2008

América do Sul: 7,5 milhões de km² de Floresta Amazônica, entre os países da Guiana Francesa, Suriname, Guiana, Venezuela, Colômbia, Peru, Bolívia e Brasil.

Brasil: 4,8 milhões de km² de floresta amazônica, 65% da área total desta floresta.

Região Norte: 3,87 milhões de km² de floresta que cobre 80% desta região.

Apesar de parecer um grande tapete verde de onde saltam aos olhos sinuosos caminhos de águas coloridas, essa maravilhosa pluralidade em composição harmônica e interconectada de formas, cores, aromas, texturas e existências faz com que esta localidade planetária seja considerada a maior em biodiversidade e a maior bacia hidrográfica do planeta, um lugar de extrema sedução. Muitos foram aqueles que se sentiram impelidos pelo ar misterioso e nobre desta região. Os naturalistas Humboldt e Bonpland, no século XIX, deram a alcunha de hiléia amazônica à floresta.

Inúmeras expedições científicas, a maioria estrangeira, interessadas nos segredos da floresta, aqui aportaram nos anos 70 a 90 do século passado, buscando conhecer a biodiversidade local como o Projeto Max-Planck, Smithsonian, JICA, Alpha-Helix, CIDA/Canadá, Finlândia, Orstom e outros.

A recente discussão, em nível internacional, a respeito das emissões que contribuem para o aumento do efeito estufa, trouxe mais foco à região que já perdeu para as queimadas o tamanho da Bahia, Pernambuco e Alagoas juntos. A idéia midiática, disseminada a nível mundial, é que a floresta amazônica salvará a humanidade de sua própria desgraça anunciada. Bem sabemos que isto é uma falácia. E a poluição e destruição no resto do mundo? E as florestas da Indonésia? Existem interesses estrangeiros sobre a diversidade do resto do mundo?

Sabemos que nos modelos atuais de aplicação da ciência e da visão política econômica, biodiversidade significa potência, poder e infelizmente, lucro, onde “valores” são anunciados em moeda corrente e não em termos ambientais, de qualidade de vida ou de futuro. E dentro desta região abundante, não só de diversidade de vida, mas de água doce, o grande patrimônio futuro da humanidade, encontramos todos os tipos de agressões, não só ambientais, como sociais e culturais, todas oriundas de um mesmo pacote ideológico que nos impinge a noção de “uso de recursos para o desenvolvimento humano e tecnológico”. Essa mesma noção criou a falsa idéia de “evolução” humana a partir da tecnologia e seus usos. E é para este tipo de ‘evolução’ que a floresta amazônica brasileira está se encaminhando: as queimadas são somente a ponta do iceberg.

A nossa soberania sobre a região amazônica é inconteste, pois esta se encontra sob solo brasileiro. Mas, como não questionar a nossa tênue soberania sabendo que nosso patrimônio genético se transforma em propriedade particular e promove o lucro de multinacionais? A biopolítica, que nos abre os olhos para as questões da biopirataria, bioprospecção, culturas tradicionais, direitos indígenas e patrimônio genético, pode ser o nosso ponto de convergência para a crítica construtiva e para as ações em prol da manutenção criativa, edificante e conservadora de todo o potencial desta floresta. As políticas nacionais, ou a falta delas, que levam a destruição deste manancial é que podem e devem ser contestadas.

A “cobiça internacional” não parece mais uma obsessão nacionalista como era à época de Artur Bernardes, nos idos de 1940, ela já é considerada realidade. Desde inserções de ONGs internacionais gerindo em espaços nacionais a religiões massacrando culturas tradicionais; extravio de seringueiras feito por ingleses para a Malásia à patente de açaí no Japão, muito já aconteceu com o potencial físico-cultural amazônico. Não se trata de um nacionalismo extremado ou equivocado, a preocupação com a ocupação, interpretação, uso e exploração da floresta na porção brasileira. Insinua-se uma tentativa disfarçada de ‘internacionalização amazônica’ e é desconcertante ver imposições transculturais, políticas e econômicas de proporções insuportáveis, vindas de outros países e continentes, intitulando-a como “patrimônio universal” para justificar atitudes intrusivas, imposições econômico-culturais e dar “parecer técnico” sobre nós e a gestão de nosso território.

Se não existisse a noção de lucro e propriedade, não precisaríamos nos preocupar com fronteiras e provavelmente nem com soberania. Se a perspectiva internacional fosse abrangente e verdadeiramente para conservar de forma holística, a região amazônica não estaria sufocada com tantos problemas e intrigas como grilagem de terras, questões fundiárias, trabalho escravo, garimpo ilegal, desrespeito cultural, corrupção, invasão de unidades de conservação ambiental e muitos outros, oriundos exatamente desta invasão multicultural interesseira e constante na região.

Um forte desejo de ruptura desse paradigma destrutivo pseudo-desenvolvimentista deverá nos guiar a uma saída de mestre deste aparente caos nesta região, que não é a única a sofrer com o desgoverno político, o descaso ambiental e os anseios externos.

O sentido de nossa existência deverá ser focado neste legado, esse grande patrimônio, que podemos e devemos manter aos nossos descendentes, com toda sua beleza e magnitude, da forma como ela é: integra, harmônica e bela em sua gigantez imensurável.

BIBLIOGRAFIA

Amazônia: interesses e conflitos, conjunto de matérias e reportagens organizada pelo editor Carlos Vogt para a ConCiência, Revista Eletrônica de Jornalismo Científico , acessado em maio/2008 em: www.comciencia.br/reportagens/amazonia;

Amazônia selvagem: um problema do tamanho da amazônia, matéria jornalística da equipe do Jornal O Globo, acessado em maio/2008 em: http://oglobo.globo.com/blogs/amazonia

Utopia científica ou internacionalização da Amazônia, matéria de Lucio F. Pinto, publicada no Jornal Estado de São Paulo em 17 de fevereiro de 2001, acessada virtualmente em maio/2008 no site: http://www.geocities.com/toamazon/toaesamazonica.htm